A escuridão e o silêncio enganam os possíveis espectadores. Mas sob a proteção do breu e da cortina de pedra, tensionado pelo perigo e passível de castigo, as chamas não se limitam. A tintura vermelha não se satisfaz com as pinceladas do artista, pelo contrário, multiplica-se. A coloração se espalha e é tanta, escorre, salta da tela nas mãos do pintor, aquecendo a si mesma com o deslizar dos pincéis.
Cheiro. Sabor. Cor. Sombra. Um banquete vivo em duplo tom. Escarlate por dentro e puramente escuro por fora, numa escala de cinza, iluminado indiretamente por uma lua quase cheia escondida no céu noturno.
Um espetáculo inédito tanto para o elenco quanto para a platéia. E as cortinas se abrem uma a uma, revelando mais e mais, incitando novos patamares de sentido, noutra escala de sintonia. Orquestra suspirante de sussurros harmônicos em canção improvisada.
Versos vazios de palavras, recheados de sentido. Diálogos metalinguísticos entrelaçados, planejados para dizer o que o arquejar já contou. E A magia continua doce. E de tão doce dá mais sede. A magnificência de um quadro deslumbrante em criação, tal qual Giocconda, perfeita em suas imperfeições, recebendo mais riqueza e mais detalhes a cada novo debruçar do dueto de pintores. Bibliotecas e Pinacotecas de ricos detalhes, salpicados de entrelinhas, mas impossíveis de serem postos explicítos. Um segredo não-secreto. Um Ato, de toda uma Peça.