Piscou para mim. Com a lentidão de um pôr do sol. Fitar a negritude da pintura de seus olhos foi como ver a bela, fria e densa escuridão que precedeu a existência de tudo. E o abrir das pálpebras, uma exuberante alvorada castanha.
Seu semblante gótico convergiu nos olhos como um beijo vampírico, bebeu-me, tragou-me. Perdi-me. Não pude lidar com essa metódica cirurgia visual senão entregando-me ao seu toque delicadamente cálido como quem se deixa abrir pelo bisturi médico. Uma seta dourada e mítica, erótica.
A nossa despretensiosa valsa, outrora efêmera, alonga-se por uma lua inteira e torna-se cada vez mais concreta, dentro desse quarteto tão certa e casualmente formado. Não tenho receio, embora não tenha anseios quaisquer para esse amanhã que pode nunca chegar.
Assim, tão leve, parece trazer consigo o poder do bater das asas de uma borboleta, movendo furacões do outro lado do mundo. Assim, sem pressa, sem pressão, tem crescido como uma árvore regada a arco-íris e não sei até onde esse pé de feijão está decidido a crescer.
Mas lascivo como mostra-se nos discos pintados em quadro branco e risonho como copos de onomatopeias virados à dose, ouso crer que pode haver gigantes lá em cima. Não aterradores ou vivos, nem mesmo literais, mas reais o suficiente para prover histórias de ninar, quiçá histórias de amor.
São destas histórias que eu me alimento e essa aqui tem um sabor que não canso de provar.