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sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Sobre dor, medicina e gratidão.



   Aqui estou. Cento e cinquenta horas e cinco minutos desde que acordei suado e olhei as horas no celular, me perguntando que diabos era aquela dor infernal que mordia tudo dentro de mim. Ainda estou mal, mas estou melhor. Ah, se estou! Ainda sinto dor, mas essa eu posso suportar.. Não me recordo da última vez que uma doença me deixou tão debilitado, se é que houve alguma vez desde que cresci.

   Agora compreendo o que Eragon quis dizer quando chamou o estigma que Durza lhe infligiu, quando chamou Aquela dor de "O Obliterador". A dor é egoísta. Ela não divide espaço com nada nem ninguém. Quanto mais intensa, mais egoísta, mais espaçosa... Mais ela se aproxima de seu propósito de obliterar por completo sua consciência de quaisquer coisas que não estejam a ela relacionadas. A dor é uma amante obsessiva e muitíssimo ciumenta.

   Quando ela vinha, eu não podia fazer nada. E a sensação de impotência, do meu próprio corpo me ferir de maneira tão excruciante... A sensação de perder um autodomínio conquistado com tanto esforço... Humilhante. Doloroso. Principalmente doloroso. A dor vinha e nublava meus pensamentos, eu não conseguia fazer nada além de deitar, fechar os olhos e bloquear o que pudesse. Suplicando ao meu corpo que parasse de me torturar, "pare, pare, só pare, por favor". Não sentia vontade de comer ou beber, enquanto revirava, apagando quando a dor passava e acordando quando ela vinha me rasgar de novo. A febre evanescia por algumas horas com um antitérmico, só para retornar, me pondo em chamas outra vez logo que o efeito enfraquecia. E Hefesto, me achando quente como um pedaço de ferro em brasa, resolveu martelar minha cabeça para me envergar numa lança, talvez...

   Glória à Esculápio, salvador de homens, curador de enfermos, sossego das parturientes! E abençoados sejam os detentores do teu cetro, nestes modernos tempos, e de todos os seus remédios, e soros, e pílulas! E há quem sinta nostalgia da Era de Ouro, dos 70, 50, dos 20... Do século XIX, XVIII... Nostalgia da varíola! Digo eu! Nostalgia da praga! Da peste! Da tuberculose, da sífilis! Nostalgia de um tempo em que alguém rico podia se considerar sortudo se chegasse aos 50!

   No meio daquele suplício, naquela situação deplorável em que eu estava, incapaz de andar à passos lentos até o banheiro sem fazer caretas de dor; varrido de qualquer vontade de comer, praticamente incapaz de pensar em linha reta, renitente até de falar, para não provocar outra crise... Tsc, tsc, tsc... Só essas pílulas brancas e esses benditos líquidos incolores me trouxeram paz. Sem eles eu  nem conseguiria dormir.

   E volto ao começo: aqui estou... melhor, mas não curado. No entanto, logo estarei chegando lá... Graças a umas benditas pílulas brancas e umas agulhas espetadas nos braços... E que Os Outros carreguem uma infecção dessa pro Diabo que o valha!

   Como observação, deixo-lhes um recado: agradeçam à medicina. Agradeçam cada segundo de cada dia a partir de agora, pode ser que algum dia vocês venham a precisar dela pra valer e a eternidade vai ser pouco para expressar a gratidão que tomará sua alma por aqueles poucos minutos de paz.

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