Páginas

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Gelo e Geladeira


   Abre a geladeira. Fecha a geladeira. Não. Abre a geladeira.

   "O que eu estou fazendo?" pensa, agoniado. Não pega nada e fecha outra vez a geladeira. "Ela não respondeu. Fazem dois dias"

   Volta pra sala, senta chateado no sofá. Resiste por exatos seis minutos e meio, revirando um site e outro, comentando as fotos que já comentou só pra se distrair. Reabre o chat no facebook. Nada.

   "Ela deve estar viajando. Ou o computador quebrou. Ela deve estar sem internet. Cortaram a luz dela. É, deve ser isso. Ela parece meio distraída mesmo, deve ter esquecido de pagar a conta de energia." pensa ele, encarando a pergunta que ficara flutuando na internet. "É. Deve ter sido isso."

   Percebe que as borboletas voltaram pro estômago, mesmo sendo apenas algumas palavras na tela. Percebe que a barriga vazia não ajuda com aquele frio na barriga. Mas ele não consegue saber se o frio é de ansiedade ou se é do gelo que estava levando.

   "Não! Droga." pensa ele novamente. "Que gelo que nada. Ela só não viu a mensagem."

   Levanta do sofá e vai até a cozinha. Puxa uma cadeira, respirando fundo. Senta em frente à porta branca. Cinco minutos de silêncio. Dez minutos de tambores cardíacos. O corpo se acalma. Ele finalmente levanta e abre a geladeira, pega a garrafa de água, fecha a geladeira e volta para a cadeira.

   "Esqueci o copo." ele reflete, com medo de voltar a pensar desenfreadamente, sem sucesso. "Droga, droga, droga."

   Levanta novamente e vai até o armário, pega um copo, volta para cadeira. Enche até a borda. Segura o copo. Não bebe. Mais um minuto se passa lentamente.  Ele levanta o copo e toma um gole. A água gelada desce pela garganta e bate no estômago vazio. O chat solta um bipe. Ele congela.

   "Só ela está liberada no meu chat." pensa ele de súbito. As borboletas voltam com tudo. O frio na barriga se junta com o frio da água gelada, e ele congela na cadeira.

   Olha para a geladeira alva e respira fundo. Não dá. O coração vai a mil. Ele levanta e deixa garrafa e o copo d'água descongelando na mesa. Volta para a sala. Um "quando?" estampado na tela deixa ele lá, petrificado. Ou melhor, congelado.

   A água descongela, ele descongela e o gelo que ele achava estar levando... Descongela.

Nenhum comentário:

Postar um comentário