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domingo, 16 de fevereiro de 2014

Paixão de Ônibus


   Forene/Trapiche. Estranhamente vazio. Familiarmente atrasado. Vinte e dois minutos atrasado para ser exato. O motorista acelerava como se o mundo estivesse acabando atrás dele, não que isso fosse de todo ruim.

   - Tá achando que vai carregando boi. - Falou uma senhora duas cadeiras a frente, alto o suficiente para todos os onze passageiros ouvirem.

   O sol da tarde entrava transversalmente pelas janelas de um dos lados da condução, dando todo um ar londrino àquela situação. Embora ambos soubessem que não era mais que uma brincadeira do acaso, uma pequena risada do destino.

   - Bom dia. - Disse ele ao motorista, soltando um sorriso despretensioso. 

   - Bom dia.

   Sorriu, cumprimentando a cobradora com um movimento da cabeça e estendo a carteira na direção do leitor de cartões. Passava da catraca com a bolsa nas costas quando trocaram olhares pela primeira vez. Os segundos mais longos da vida.

    Ela estava sentada numa das últimas cadeiras e o viu subir, olhando-o apenas com curiosidade, mas quando seus olhares se encontraram, o coração subiu à boca, como se também quisesse espiar por sua garganta. Ela fixou os olhos nele, examinando seu jeans escuro, a camisa amassada. Encarando-o enquanto ele andava através do corredor do ônibus. Uma curva repentina do motorista quase o jogou através da janela e ela soltou uma risada incontida.

   Involuntariamente tendo sido sentado numa cadeira e um tanto quanto constrangido, ele a ouviu rir e não pôde pensar em outra coisa senão em como a risada dela era bonita. Encontraram os olhos um do outro pela segunda vez. Ela tinha olhos castanhos, o cabelo parecia a moldura perfeita para o rosto arredondado. Ergueu-se novamente com um sorriso torto e voltou a caminhar. Ela virou o rosto para acompanhá-lo por um segundo. O coração acelerou.

   Ela o viu passar para a cadeira atrás dela. Não entendeu porque ele não sentara ao seu lado... Talvez achasse que ia assustá-la, afinal havia muitas cadeiras vazias. Olhou pela janela, tentando vê-lo com o canto do olho. Decepção. Seu ponto era o próximo. Ficou de pé, puxando a corda. Ouviu o apito agudo no momento em que virou para o fundo do ônibus.

   Ele ergueu os olhos no momento em que ela se levantou. Estava tomando coragem para se levantar e sentar do lado dela, perguntar seu nome. Tarde demais. Abriu e fechou a boca sem emitir som, enquanto ela o olhava novamente, seguindo para a escada.

   Ela fechou o sorriso, fazendo bico antes de perceber que estava sendo boba. Sorriu novamente quando ele balbuciou algo baixo demais.

   - Tchau. - Disse ela, passando por ele.

   Ele ainda chegou a se empertigar, aprumando-se no banco, enquanto mil frases passavam por sua cabeça, mas a eloquência pulara pela janela. Tudo que conseguiu foi gaguejar.

   - Tchau. - Ele falou.

   Ela desceu, olhando para o ônibus enquanto o motorista voltava a acelerar. Ele a encarou mais uma vez pela janela, acenando. Ela retribuiu o aceno antes que o ônibus partisse.

   Então a condução virou a esquina e a vida continuou a partir dali.

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