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sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

O Apanhador de Sonhos



   O sol caía por um janelão, limpo até onde ela conseguia alcançar, enchendo o quarto todo com uma luz branda de um dia nublado. Acordei com o formigamento de uma noite perfeita me arrepiando o corpo.

   Ela já havia levantado, deixando o lençol meio caído para fora da cama... Conseguia ouvi-la cantando alguma música baixa, seus pés nus tocando o chão.

   "Ela está dançando", pensei com um sorriso, voltando a deitar minha cabeça no travesseiro. "Tem o cheiro dela."

   E que cheiro bom ela tem. Levei tanto tempo para perceber. E tão pouco para conseguir me apaixonar.

   Foi a primeira vez que ela me trouxe aqui de verdade. Nas outras foi apenas uma curta visita. Fiz café, sentamos no chão do quarto dela. Que bela decoração ela tem - simples, é certo, mas bela. Peculiar. Esta é a palavra. Talvez ela esteja certa... Eu presto muita atenção nos detalhes. Essas peculiaridades me enlaçam.

   "O apanhador já faz parte do quarto", pensei ao vê-lo balançar com a brisa, preso por um fio de lã num pequeno prego. " Como se estivesse ali desde sempre."

   Voltei a fechar os olhos com um sorriso estúpido no rosto. Reabri as pálpebras, piscando, enquanto tentava recordar de toda a noite. Impossível. Pela primeira vez, não bebi nada, mas fiquei embriagado. O edredom dela virou uma espécie de templo. Não quero sair, temo acabar destruindo essa mágica, seja magia, seja truque.

   "Quem dorme de edredom em Maceió?", pensei com meus botões, ainda que minha camisa estivesse no chão. "Não importa. É mais uma peculiaridade. E eu adoro."

   O cheiro de café começou a subir. A vi passar de relance pela porta, vestida de pijama. Nunca vi ninguém tão sexy na vida. Deve ser algo com o cabelo curto. Coloquei as mãos sob a cabeça, refletindo em como a vida havia mudado tão repentinamente.

   "Somos os dois tão diferentes, mas tão parecidos. Em pensar que ela, sentimental assim, brotou essa parte de mim." cogitei, quando ela começou a me espiar.

   Ela sorriu devagar, com certa timidez, talvez sem saber o que eu faria. Mergulhei nos olhos dela como quem afunda devagar numa banheira de água quente. Já estava me perdendo ali, vagando no olhar dela, quando ela fechou o sorriso numa curvinha devassa e ajeitou os óculos. Meu sorriso surgiu igualmente.

   "Como pude demorar tanto?", me perguntei enquanto ela vinha na minha direção, subindo na cama e engatinhando para me dar um beijo. Olhei para o círculo trançado que balançava as penas coloridas na parede e sorri mais uma vez antes de trazê-la para junto de mim.

   "Apanhe este sonho, amigo. E guarde-o por mim"

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