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segunda-feira, 15 de julho de 2013

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    Começa pela base. Um par de pés largos com dedos e unhas simétricas, mas irrelevantes, por estarem quase sempre acobertados por calçados reles que sejam.
    Num passo cadenciado e nobre, firme e suave, semi-felino, intercala direita e esquerda, direita e esquerda. Magras, esguias e isentas de charme muscular, as pernas espelham uma a outra na carne, mas se contradizem nas inúmeras cicatrizes minimalistas e nos sinais de nascença que pontuam de preto a pele indígena.
    Negritude capilar, arranhões de infância, pele corada e as elevações ósseas sob ela marcam o transpasse para o macérrimo tronco tronco de linhas poucas. O oculto diafragma marca uma inspiração, seguida de uma longa expiração sob um abdômen de musculatura definida, mas tudo isso é nada diante do forte batimento cardíaco, pulsando - com fúria - o sangue em cada curva.
    Ao longo do centro, estendem-se os braços em ambos os lados. Dedos longos e inquietos, tocam as próprias pontas para matar uma incessante fome tátil, impacientando-se com o pulsar sanguíneo sob as marcações quiromânticas que ali se escondem. Em poucas curvas sobem até os ombros, tatuados de teias biológicas. Todas essas artérias visíveis se contraem no caminho da traqueia masculina pouco antes duma baixa e rouca risada se fazer ouvir.
   Uma sombra marca-lhe os contornos bem desenhados da face. No topo, uma indecisa convenção de ondulações negras se agita ao vento sobre as cartilaginosas e afinadas orelhas. Sob o nariz arredondado de inspirações profundas, abre-se entre os lábios a curva de aura clara que marca sua presença. Um sincero e quase sempre apaixonado sorriso.
    Tudo isso, no entanto, é só um prólogo. Mais acima, olvidando quaisquer mescla de cores florestais e outonais, há um par de olhos.
      E há fogo nestes olhos!

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